sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

SÉRIE DE NATAL: A MANJEDOURA, A MESA E A CRUZ

Em dezembro de 2014 me impus o desafio de re-ler a crônica do Natal. Uma re-visita ou apreciação por outros e novos ângulos de modo que o apreciador, cristão ou leitor do Séc. XXI, numa sociedade pós-cristã – já despida do brilho e colorido que a época trazia outrora, se entusiasme pela história, especialmente por seus personagens. Volto à baila. Não que a crônica precise de novos atrativos, senão de re-descobertas.

Compartilho desta feita sobre os símbolos associados à encarnação – e aí passaremos necessariamente pela natividade. Na passagem do Deus encarnado a manjedoura, a mesa e a cruz, são revestidos de simbologia. Pensemos:

1) Manjedoura É maravilhoso que a porta de entrada do Messias seja o ventre da mulher escolhida, Maria; mas não menos maravilhoso que o Deus encarnado seja acolhido numa manjedoura. No grego é phátne, usada por Lucas (2.7, 12 e 16). O perito médico, após sua apuração jornalística (Lc 1.1ss), profissional da ciência que foi, é quem alude ao estábulo: Forçados pela falta de acomodação ou hospedaria adequada à uma parturiente, o novel casal aporta numa estebaria.

A manjedoura é o hangar do Deus encarnado!

Definitivamente a manjedoura está associado ao Cristo, à natividade, ao Natal. É a maternidade do Rei! É o improviso no campo, é a providência de Deus sobre um casal de caminhantes, já cansados e à hora de parir.

Deus usa o lugar do manjar dos animais para nos oferecer Seu Pão da Vida, Sua Água Viva, o alimento eterno! A manjedoura é parte do set do presépio. A manjedoura é símbolo do Cristianismo e do Cristo, marcando seu nascimento.

2) A Mesa A mesa descreve os relacionamentos e os propósitos da relação que Cristo estabelece e propõe com seus seguidores, chamados de amigos, discípulos, para nós, apóstolos. Na mesa a sós, na intimidade (Mt 26,20; Mc 14,17 e 20; Lc 22,14), Jesus institui a Ceia e lava os pés dos discípulos. Associada à mesa estão: O pão, o vinho, a bacia e a toalha.

Não há consenso na ordem entre a Ceia (Mt 26, 26-29; Mc 14, 22-25; Lc 22, 14-20) e o lava-pés (Jo 13, 1-20).. Para nós o importante é a simbologia:

A mesa irradia a koinonia e o serviço! Compartilhamos o pão e servimos uns aos outros porque amamos e amamos porque compartilhamos o pão e servimos uns aos outro.

Os três sinóticos e o relato de Paulo (1 Cor 11, 23-26), muito parecidos entre si: “Fazei isto em minha memória". E: “Eu vos dei exemplo para que como eu vos fiz, façais vós também”. A mesa pois, encerra comunhão e o serviço nas relações do Cristo para com os seus; e deve ser assim mutuamente entre nós, cristãos! Portanto, além da manjedoura, a mesa.

3) A Cruz Se a manjedoura é o hangar, a mesa, uma estação, a cruz é o destino do Deus encarnado. O próprio Cristo a elege como símbolo de sua mensagem e missão: “E dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me.” (Lc 9.32). A cruz é a identificação do seguidor com Ele. E o Novo Testamento confirma-o: Para Paulo, a cruz faz parte do Credo (I Co 15.1-4); para quem a cruz deve ser pregada (I Co 1.18, 23 e 2.2).

É impossível separar a cruz do Cristo. O Cristo na cruz é a denuncia de sua humilhação; o Cristo fora dela é a anúncio de seu triunfo! Aos Filipenses 2, de 9 ao 11, o apóstolo descreve este roteiro.

Aplicações

Neste Natal, a proposta é reavivar os símbolos associados ao Deus encarnado. Para uma práxis, uma aplicação cotidiana podemos concluir que:

- São Símbolos Móveis: O berço foi artesanal, uma maternidade improvisada; a mesa foi transposta da casa do incógnito anfitrião até sua teatralidade nas comunidades cristãs desde então “em memória” dEle. A cruz foi carregada do Sinédrio ao Gólgota. Ainda que uma modalidade ou versão tradicional do cristianismo tenha insistido em sacralizar peças e símbolos, o fato é que os símbolos relacionados ao Cristo apontam para nossa peregrinação. Estamos passando por este mundo e Jesus inaugurou essa transitoriedade, caminhada, jornada: o casal de caminhantes do Natal aporta num berço de palha; Seu filho transita entre nós até ir aos céus; e nos envia como peregrinos e forasteiros (I Pe 2.11). O berço, a mesa e a cruz estão introjetados na vida do crente; são sentimentos que despertam seus significados: Simplicidade, comunhão, serviço e identificação.

- A Centralidade do Cristo, para quem convergem as ações e de quem seus símbolos devem irradiar: Pessoas em torno da manjedoura; pessoas em torno da mesa da Ceia; pessoas em torno da cruz. O sentido, a causa, o efeito de nossa aproximação da manjedoura, da mesa e da cruz é Ele! Pois dele, por ele e para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! Amém” (Rm 11.36).

-A Confecção dos Símbolos Usados não é Casual: O Rei não é cuidado no leito de bronze. A mesa em torno da qual as lições são partilhadas não é dourada; a cruz não é de ferro. Jesus não usa coisas duráveis, inquebráveis, resistentes. Usa sim, o artesanal, manipulável, o que remete às nossas fraquezas e limites. Não somos usados porque somos fortes e resistentes, mas, usados apesar das nossas fraquezas e finitudes.

- Não estamos diante de objetos que possam ser imaginados, re-avivados em nosso imaginário, sem remetê-los à comunidade, amizade, partilha: A Igreja é vida em corpo; Jesus envia aos pares (Lc 10); os magos ladeiam a família ante o berço; a mesa da Ceia é experiência dos 13; há pessoas no pé da cruz – discípulos, mulheres. Os símbolos celebram nossos laços humanos e fraternais. Se a gente se alegra no Natal e se entristece na Paixão, há uma mesa como estação pra gente compartilhar.

O carpinteiro, o marceneiro, o escultor, o manejador destes materiais – o leito de palha, a mesa e a cruz, nos remetem ao uso – finalidade. Dalguma forma o berço recebe crianças; a mesa recebe amigos para a partilha do pão; a cruz recebe, acolhe os crentes nEle.

Na pretensão de se distinguir do Catolicismo, o Protestantismo se despiu dos símbolos que são do Cristianismo, logo, nossos templos tornaram-se quais caixotes sem arquiteturas e desenhos sacros. Portanto, neste Natal, reavivemos a simbologia do Deus encarnado: Não é um cetro, uma coroa ou trono. São objetos, utensílios prosaicos, domésticos, pastoril, camponês que são expostos. By Geraldinho Farias

Nenhum comentário:

Postar um comentário

CLOSE (2022)

É desafiador abordar temas complexos. Podemos discutir o "como" o roteiro (Lukas Dhont) foi tocado - entre a primeira e a segunda ...