Em dezembro de 2014 me impus o desafio de re-ler a crônica do Natal. Uma re-visita ou apreciação por outros e novos ângulos de modo que o apreciador, cristão ou leitor do Séc. XXI, numa sociedade pós-cristã – já despida do brilho e colorido que a época trazia outrora, se entusiasme pela história, especialmente por seus personagens. Volto à baila. Não que a crônica precise de novos atrativos, senão de re-descobertas.
Compartilho desta feita sobre os símbolos associados à encarnação – e aí
passaremos necessariamente pela natividade. Na passagem do Deus encarnado a
manjedoura, a mesa e a cruz, são revestidos de simbologia. Pensemos:
1) Manjedoura É maravilhoso que a porta de entrada do Messias
seja o ventre da mulher escolhida, Maria; mas não menos maravilhoso que o
Deus encarnado seja acolhido numa manjedoura. No grego é phátne, usada por
Lucas (2.7, 12 e 16). O perito médico, após sua apuração jornalística (Lc
1.1ss), profissional da ciência que foi, é quem alude ao estábulo: Forçados
pela falta de acomodação ou hospedaria adequada à uma parturiente, o novel
casal aporta numa estebaria.
A manjedoura é o hangar do Deus encarnado!
Definitivamente a manjedoura está associado ao Cristo, à natividade, ao
Natal. É a maternidade do Rei! É o improviso no campo, é a providência de Deus
sobre um casal de caminhantes, já cansados e à hora de parir.
Deus usa o lugar do manjar dos animais para nos oferecer Seu Pão da
Vida, Sua Água Viva, o alimento eterno! A manjedoura é parte do set do
presépio. A manjedoura é símbolo do Cristianismo e do Cristo, marcando seu
nascimento.
2) A Mesa A mesa descreve os relacionamentos e os propósitos da
relação que Cristo estabelece e propõe com seus seguidores, chamados de amigos,
discípulos, para nós, apóstolos. Na mesa a sós, na intimidade (Mt 26,20; Mc
14,17 e 20; Lc 22,14), Jesus institui a Ceia e lava os pés dos discípulos.
Associada à mesa estão: O pão, o vinho, a bacia e a toalha.
Não há consenso na ordem entre a Ceia (Mt 26, 26-29; Mc 14, 22-25; Lc
22, 14-20) e o lava-pés (Jo 13, 1-20).. Para nós o importante é a simbologia:
A mesa irradia a koinonia e o serviço! Compartilhamos o pão e
servimos uns aos outros porque amamos e amamos porque compartilhamos o pão e
servimos uns aos outro.
Os três sinóticos e o relato de Paulo (1 Cor 11, 23-26), muito parecidos
entre si: “Fazei isto em minha memória". E: “Eu vos dei exemplo para que
como eu vos fiz, façais vós também”. A mesa pois, encerra comunhão e o serviço
nas relações do Cristo para com os seus; e deve ser assim mutuamente entre nós,
cristãos! Portanto, além da manjedoura, a mesa.
3) A Cruz Se a manjedoura é o hangar, a mesa, uma estação, a cruz é
o destino do Deus encarnado. O próprio Cristo a elege como símbolo de sua
mensagem e missão: “E dizia a todos: Se alguém quer vir após mim, negue-se a si
mesmo, e tome cada dia a sua cruz, e siga-me.” (Lc 9.32). A
cruz é a identificação do seguidor com Ele. E o Novo Testamento confirma-o:
Para Paulo, a cruz faz parte do Credo (I Co 15.1-4); para quem a cruz deve ser
pregada (I Co 1.18, 23 e 2.2).
É impossível separar a cruz do Cristo. O Cristo na cruz é a denuncia de
sua humilhação; o Cristo fora dela é a anúncio de seu triunfo! Aos Filipenses
2, de 9 ao 11, o apóstolo descreve este roteiro.
Aplicações
Neste Natal, a proposta é reavivar os símbolos associados ao Deus
encarnado. Para uma práxis, uma aplicação cotidiana podemos concluir que:
- São Símbolos Móveis: O berço foi artesanal, uma maternidade
improvisada; a mesa foi transposta da casa do incógnito anfitrião até sua
teatralidade nas comunidades cristãs desde então “em memória” dEle. A cruz foi
carregada do Sinédrio ao Gólgota. Ainda que uma modalidade ou versão
tradicional do cristianismo tenha insistido em sacralizar peças e símbolos, o fato
é que os símbolos relacionados ao Cristo apontam para nossa peregrinação.
Estamos passando por este mundo e Jesus inaugurou essa transitoriedade,
caminhada, jornada: o casal de caminhantes do Natal aporta num berço de palha;
Seu filho transita entre nós até ir aos céus; e nos envia como peregrinos e
forasteiros (I Pe 2.11). O berço, a mesa e a cruz estão introjetados na vida do
crente; são sentimentos que despertam seus significados: Simplicidade,
comunhão, serviço e identificação.
- A Centralidade do Cristo, para quem convergem as ações e de quem seus
símbolos devem irradiar: Pessoas em torno da manjedoura; pessoas em torno da
mesa da Ceia; pessoas em torno da cruz. O sentido, a causa, o efeito de nossa
aproximação da manjedoura, da mesa e da cruz é Ele! Pois dele, por ele e
para ele são todas as coisas. A ele seja a glória para sempre! Amém” (Rm
11.36).
-A Confecção dos Símbolos Usados não é Casual: O Rei não é cuidado no
leito de bronze. A mesa em torno da qual as lições são partilhadas não é
dourada; a cruz não é de ferro. Jesus não usa coisas duráveis, inquebráveis,
resistentes. Usa sim, o artesanal, manipulável, o que remete às nossas
fraquezas e limites. Não somos usados porque somos fortes e resistentes, mas,
usados apesar das nossas fraquezas e finitudes.
- Não estamos diante de objetos que possam ser imaginados, re-avivados
em nosso imaginário, sem remetê-los à comunidade, amizade, partilha: A Igreja é
vida em corpo; Jesus envia aos pares (Lc 10); os magos ladeiam a família ante o
berço; a mesa da Ceia é experiência dos 13; há pessoas no pé da cruz –
discípulos, mulheres. Os símbolos celebram nossos laços humanos e fraternais.
Se a gente se alegra no Natal e se entristece na Paixão, há uma mesa como
estação pra gente compartilhar.
O carpinteiro, o marceneiro, o escultor, o manejador destes materiais –
o leito de palha, a mesa e a cruz, nos remetem ao uso – finalidade. Dalguma
forma o berço recebe crianças; a mesa recebe amigos para a partilha do pão; a
cruz recebe, acolhe os crentes nEle.
Na pretensão de se distinguir do Catolicismo, o Protestantismo se despiu dos símbolos que são do Cristianismo, logo, nossos templos tornaram-se quais caixotes sem arquiteturas e desenhos sacros. Portanto, neste Natal, reavivemos a simbologia do Deus encarnado: Não é um cetro, uma coroa ou trono. São objetos, utensílios prosaicos, domésticos, pastoril, camponês que são expostos. By Geraldinho Farias
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