sexta-feira, 19 de setembro de 2014

MINISTROS NO OLHO DO FURACÃO

No final de 2013 três pastores cometeram suicídio na América e num espaço de 30 dias - Teddy Parker Jr., 42, pastor da Igreja Batista Bibb Mount Zion, na Geórgia; Ed Montgomery, que estava de luto pela perda da esposa atirou em si mesmo na frente de sua mãe e filho; e Isaac Hunter, o ex-pastor da igreja Summit em Orlando, Florida... No Brasil o suicídio do líder Agnaldo Freitas Júnior em 9/9, pastor da Primeira Igreja Batista de Serrinha/BA, suscitou debate sobre as condições e pressões no exercício do ministério pastoral. Aqui, algumas reflexões de um aprendiz e observador desta augusta atividade:

- Expectativas altas, encanto, fascínio. Apesar dos assustadores casos conhecidos de ministros em desencanto, frustrados ante os desafios impostos – alguns até desistindo, a procura ainda é relativamente grande. Cursos de teologia ainda são razoavelmente procurados por calouros e vocacionados com a ilusão de que o ministério resume-se em visitar e pregar algumas vezes na semana.

- Desorganização pessoal. Dois polos: Num extremo, o ministro em tempo parcial qual malabarista precisa equilibrar-se ante o ministério e seu trabalho; noutro extremo, o ministro em tempo integral que não estabelece prioridades, investe energia desnecessária.

- Preparação inadequada e insuficiente. Cresce os cursos à distância, cursos curtos etc Para tamanha e diversa demanda, todo o preparo é pouco. Ouço de muitos jovens: “Preciso construir a nova sede da igreja e não sei por onde começar”. Hoje, a construção de um prédio é um desafio menor em relação a outros problemas... Para ser missionário, psicólogos aplicam testes como parte do processo. Um dos objetivos é saber da capacidade, equilíbrio e resiliência que o candidato tem para enfrentar situações-limites. Prática deveria ser adotada para vocacionados ao ministério.

- Descuido com a própria saúde. Retiros e Acamps – quando os ministros se juntam, eis a cena: A maioria está acima do peso; sedentários; hipertensos e descuidados. Eis uma combinação suicida!

- Excessiva centralização. Grande parte não treina a equipe; não delega. É um faz-tudo. “Cobra o escanteio e corre pra cabecear”. O sujeito leva o trabalho para casa – muitos acham irrelevante ter um escritório para “separar as coisas”. Quem deve disciplinar o povo sobre abusos e invasões, a começar por sua equipe? 

- Comunidades movem-se pela produtividade e ativismo dos seus líderes. O ministro aceita a exigência. É difícil avaliar quem trabalha com a mente. Logo, para muitos, não basta fazer é preciso mostrar que faz. O ministro, portanto, vive numa engrenagem perigosa. Ser líder, pai, marido, professor...

- Demandas. Os problemas compartilhados pelos paroquianos exigem cada vez mais conhecimento, atualização, atuação pessoal... Há comunidades por demais exigentes; ouço de pastores sobre exigências abusivas, quando não absurdas. Com relação à educação dos próprios filhos; à apresentação pessoal; à efetiva atuação (não apenas participação) da mulher no ministério. Tempo precioso é investido na administração de crises intragrupo, interpessoais; na resolução de conflitos entre paroquianos.

- Pathos pessoal. O sofrimento pessoal é tocante: Sofrimento pelos resultados da comunidade – sobretudo os qualitativos e quantitativos; por sentir-se incompetente, despreparado; cobrado pela família, comunidade; o ministério torna o ministro numa “esponja”. Absorvedor de problemas em diversos níveis. Isso é crítico. Stress é um diagnóstico comum - passou do nível de alerta, resistência, e, finalmente, para a exaustão - está doente!

- A manutenção da família. O comum em comunidades pequenas (até 200 membros e nas periferias ou no interior), são pastores recebem gratificação insuficiente para a manutenção da família.

- Na preparação de vocacionados há necessidade de se aprofundar o “estágio”. O Curso de Teologia + Concilio somente não podem dispensar um período de estágio com mentor. Quanto mais filtros e aprimoramento, melhor.

- O dia de descanso é negligenciado. Guardar o sábado é um dos mandamentos mais desprezados por muitos líderes.

- Não há uma única razão para o grau de insalubridade e periculosidade de um ministro. A soma destes fatores aqui descritos são apenas a ponta de um iceberg.

Na altura dos meus 16 anos de ministério e 7 anos de clínica, essas considerações estão longe de acabar; são apenas uma observação longinqua. O ministério é insalubre (relacionado ao ambiente nocivo, que faz ou pode fazer mal à saúde) e de alta periculosidade (relacionado ao trabalho perigoso). Especificamente na Denominação Batista há pessoas mais capacitadas que eu para apontar caminhos. Mas, arrisco alguns:

- Formação acadêmica + Concílio + Estágio com supervisão de um mentor. Alguns jovenzinhos não possuem noção do que os aguarda: São lançados num mar com tubarões.

- A formação de grupos de ajuda – mentoria, aconselhamento... ainda esbarra em relações entre ministros sob desconfiança. Refiro-me a ministros que não se constrangem de fofocar, descortinar confissões alheias e compartilhar intimidades. Realidade escandalosa! Para ser mentor, um indivíduo mais experiente deve também ser treinado. Graças a Deus, há ministros cuja integridade são nossas reservas morais. As ordens deveriam levantar os ministros experientes, jubilados, líderes altamente respeitados, reuni-los e desafiá-los a uma colaboração singular com relação aos mais novos.

- A formação acadêmica deve ser a mais exaustiva, abrangente o possível – falo na contramão de cursos do tipo “macarrão instantâneo”. O aluno deve saber sobre administração financeira, uso de orçamento, cuidados com a saúde mental etc.

- Diante de resistências e barreiras existentes com relação aos profissionais da saúde mental – psicólogo e psiquiatra – alguns profissionais em parceria ou sob convênios – deveriam ser apresentados ou até mesmo oferecidos pelas corporações denominacionais – Convenção, ordens, associações etc. em cada região. Serviços recomendados soam como cuidados para com os que militam.

- Qualidade de vida. Os líderes devem ser estimulados e orientados a manterem disciplina e rotina de cuidados básicos na saúde: Alimentação + exercícios físicos + consulta médica regular + check-up anual + guarda do sábado (leia-se dia de descanso semanal).

Sobre o enfrentamento de problemas como depressão, esgotamento físico e mental, o Instituto Schaeffer, afirma que 70% dos pastores lutam constantemente com a depressão, e 71% estão “esgotados”. Além disso, 72% dos pastores dizem que só estudam a Bíblia quando precisam preparar sermões, 80% acredita que o ministério pastoral afeta negativamente as suas famílias, e 70% dizem não ter um “amigo próximo”. O Instituto também estima que 80% dos estudantes de seminário (incluindo os recém-formados) irão abandonar o ministério dentro de cinco anos. Não há dados consistentes sobre quantos cometem suicídio, mas está claro que os pastores não estão imunes a isso. Esses são dados desoladores.

Há problemas no ministério. Mas também há problemas nos ministros – em sua forma de ser e fazer. Ressalte-se que há exceções. Exceções valorosas, de comunidades e pastores. 

Pra construirmos uma relação melhor entre nós, precisamos rever primeiro nosso trato. Luiz Antonio dos Santos (IB Jd. do Lago, S. Bernardo/SP), pastor e psicólogo, há anos denuncia a "coleguice" pastoral. Pastores referem-se mutuamente a “colega pastor”. Colega vem do Latim colega (com= junto + legere = escolher, colher, definir). A ideia e de uma pessoa escolhida para trabalhar junto.

Melhor seria se fossemos “companheiros”; do Latim companio (com=mais + panis = pão), literalmente companheiro de pão, parceiro de mesa. Mas, o que mais se aproxima do ministério é a relação do Cristo: “Já não vos chamo servo... mas de amigos” (Jo 15.15). Para ouvir, abraçar, carregar, consolar, estimular é preciso que sejamos amigos.

Não é intenção um discurso protecionista e vitimista para com os que exercem a vocação. Sem generalizações - graças a Deus inúmeros ministros vivem de forma confortável e estável em suas atividades.

Os clamores de hoje já lançam luzes sobre os papéis das associações de ministros, ordens de ministros e denominações. Se houver agenda para iniciativas de socorro aos ministros, afinal, temas como disputa eleitoral e outras “prioridades” já ocupam bastante espaço. Devemos contar com graça de Deus. Um ministro só cumpre o bom combate por sua vocação. As demandas são gigantescas e assustadoras. By Geraldinho Farias

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